7.2.08

Cobertura carnavalesca

Até para quem não vai ao carnaval é difícil ficar alheio à folia. Vez por outra, entre todas as outras possibilidades de ouvir falar do reino momesco, o sujeito encontra um aparelho de TV, ligado numa emissora que faz a cobertura do evento. Destaque para Globo e Bandeirantes.


Ticiana Villas Bôas (esq), formada pela Facom/UFBA,
foi uma das repórteres da Band no carnaval de Salvador


A Band já há algum tempo, saindo do eixo Rio São Paulo, transmite o carnaval de Salvador. E agora em 2008, ano do centenário do frevo, resolveu brindar os foliões “at home” com os carnavais de Recife e Olinda.
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Dos trechos que vi, apesar da massante mechandising da Coca Cola, achei legal a interatividade entre os reportes trabalhando nos dois estados nordestinos. No mais, não percebi muita coisa que mereça “alfinetar” o trabalho dos caras, como diz um amigo meu.
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Já na Globo, tudo continua sem novidade. A emissora ainda pensa que o Brasil é uma das suas novelas das oito. Rio de Janeiro, Leblon, etc, etc, etc. Só que, como é Carnaval: “Desfile das Escolas de Samba! Ao vivo!”. Nada contra a transmissão dos desfiles. Nem do Rio e nem de Sampa. Porém, a cobertura...
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Câmeras especiais. Aquários montados em plena Marqueis de Sapucaí e um montão de repórteres a todo canto. O alvo para as entrevistas são integrantes e personalidades a desfilarem nas Escolas de Samba. “como é o sentimento de está aqui?”, “o coração tá batendo forte?”, “o que você acha?”, “é muita emoção né?”. Resumindo, as perguntas são quase todas neste estilo. “Aí, vamô pensar numas indagações mais espertas, aí”.
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“Oxente! Mas tu também não pode dizer que a Globo não dá espaço para a Bahia”. Claro que dá, né gente!? Lembre-se que tem a retransmissora local. A TV Bahia, da Rede Bahia, de... vocês já sabem quem.
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O pessoal estava lá trabalhando, o trio de Ivete ia chegando, os comentários iam aparecendo, mas de repente a cantora achou de simular um beijo no repórter da Band. Daí já viu! Na rede dos Marinhos, não se dá “Ibope” aos concorrentes. Câmara se afasta e... “roda , roda, roda Chacrinha, um minuto de comercial/ alô, alô Teresinha...”.
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Na segunda-feira, transmissão local na hora da Sessão da Tarde. Daniela Mercury dando entrevista no set da TV em pleno Campo Grande. O pessoal parecia babar diante da “Rainha do Axé”. Também, vale dizer, em certo sentido, ninguém pode condená-los por isso.
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De repente, resolveram mostrar imagens da apresentação de Daniela no dia anterior. A legenda dizia: “Barra - ontem há noite”. Agora imagine vocês se não tivesse existido a noite do dia anterior? Mas, se a frase se referia a ontem, deveria então ser: havia noite. A noite poderia deixar de ter existido? Ah, sei lá...
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Como, “não estamos aqui na condição de Observatório da Imprensa, visse!”, e sabemos que macaco não olha para o rabo, lembro-te que “tu falastes do erro dos outros, mas não visse os teus”.
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Então. Para não ser vitima e algoz, anunciamos que estar todo mundo perdoado. E depois, nesses momentos de festas de inversão da ordem, um pileque ou um gorozinho de leve é sempre bem-vindo. Se era Carnaval, é claro que a cobertura tinha de ser carnavalesca.


* imagem tomada de emprestimo no site da Band

2.2.08

A gestante no ônibus em tempos capitais

Diferente de Caetano ele ainda não tinha visto a mulher preparando outra pessoa. O tempo e os indivíduos em volta não pareciam preocupados com aquela barriga. O ônibus parou; era ponto de passageiros.
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A gestante subiu pelo fundo da condução mesmo. Torniquete, trocador, empurra-empurra e alguns outros sinais de lotação mais que máxima. A placa na frente indicava: “46 passageiros sentados”. Em pé, a olho nu, percebia-se no mínimo outra quantidade e meia daquela.
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Por entre todo este aperto, típico de corredor de ônibus urbano cheio, está em pé uma dama e a sua singela cria no ventre, com cinco ou seis meses de gestação.
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Quando percebe a cena, o passageiro não se contém. Saí do seu lugar à janela, espremendo-se entre as pernas do outro passageiro, sentado inerte no lado do banco próximo ao corredor. A moça ainda tenta sinalizar uma negativa ao oferecimento, mas é traída pelo seu belo sorriso. Este já denúncia o acatamento à proposta e ele já vai tomando seu lugar ao assento.
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Em pé, após ouvir alguns agradecimentos, tal qual Roberto Carlos, ele pensa: “Espero que tenha sido com muito amor e seja quem for, há de achar você também tão linda, esperando neném”.
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Que romantismo tolo! Não há mais espaço para isso. Hoje a coisa é feita de modo diferente. Há casos sem intenção. Um descuido, uma camisinha estourada, o esquecimento da pílula... Ou de modo intencional mesmo. Assim, como tão falando com grande freqüência nas rádios FMs da periferia. “Quer beber? Ou quer fazer bebê agora?”.
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Pelo sim pelo não, o gentil passageiro resolve começar um bate-papo. Estaria ele esteticamente encantado pela dama a quem fizera a gentileza? E se ela fosse feia? Será que haveria gentileza mesmo assim?
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Pára, pára, pára. Deixemos de desconfianças. Não é a todo momento que se está disponível para ser Brás Cubas. Quem é côxa pode ser bonita, ou vice-versa. Lembremos que a realidade não segue o padrão de perfeição imaginado ou inventado pelo ser humano.
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Divagações filosóficas à parte. Volte-mos ao bate-papo.
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- Por que você não entrou pela frente? – indagou o rapaz, pretendo informar à gestante que ela teria direito de ingressar na condução sem pagar e sem o constrangimento de passar pelo torniquete.
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- Eles tiraram esse direito. Agora a gente tem de pagar.
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- Absurdo!
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A informação ignorada pelo rapaz é confirmada por outra passageira ao lado. Ela re-afirma a noticia da gestante. Pode parecer absurdo, mas mulher grávida paga passagem. Entretanto, a passageira faz uma observação:
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- Você poderia ter entrado pelo frente e ir até o cobrador para pagar a sua passagem. Já pensou se esse ônibus rasta e você leva uma queda ou trompasso?
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Parece que a moça não estava mesmo atenta para isto. E nem todos estavam atentos para ela. E qual seria a novidade? Era apenas mais uma jovem grávida, entre tantas jovens grávidas que tem por aí, que não são apresentadoras de TV.
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O ponto do passageiro chegou, ele se despediu da bela gestante e ela respondeu com um “obrigado”, acompanhado de um sorriso encantador.
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É capitalismo. O que não tem fetiche ou não tem valor de mercadoria, paga a conta, está por fora. E olhe que há quem diga ser a placenta “a melhor das embalagens”.
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