3.8.08

O circo chegou! E já foi

Foi rápido assim. Final de semana destes do mês de julho recém passado. O circo chegou em Irará. Teve espetáculo na quinta, sexta, sábado, domingo. Na terça, o circo já estava de partida.

A companhia parecia até ter uma boa estrutura. No anúncio: Globo da Morte, trapezistas, palhaços... Dois espetáculos à noite. Sendo um às 19h e o outro às 21h. No domingo, ainda mais a tradicional matiné.

Dava curiosidade. “Poxa! Há tempos que não se via um circo por aqui”. Mas, a prudência aconselha esperar pelos comentários. Com alguma indicação da qualidade do circo, a gente vai. Ou não.

A precaução se dá, não por preconceito com a arte circense, mas por receio de desconforto e decepção. Desconfiança, fatalmente criada devido à contribuição de alguns circos.

Mambembes

Trago na lembrança a imagem de circos nada agradáveis.

Já teve circo com teto solar. Daquele tipo como a lona cheia de “escotilhas”, formidáveis para as noites de céu estrelado. Outros traziam um leão na jaula, mas só para enfeite.

O bicho não participava do espetáculo e, a julgar pela sua aparência, talvez, estando em dia com o INSS, já poderia ter se aposentado umas três vezes por tempo de contribuição.

Havia circos com as dançarinas, ou melhor, “rombeiras” (como eram chamadas a moças), bem inspiradoras do nome ao qual eram anunciadas, ao som das ditas “guitarradas” (se bem que esse “rombeira” deve vir de “rumba” e não de outra coisa...).

Preconceitos e celulites à parte, nem mágica do Pitanguy poderia resolver.

Por falar em magia, os truques dos ilusionistas de alguns destes circos mambembes não eram nada interessantes. Monótonos, repetitivos e previsíveis.

E os palhaços eram daqueles que confundem fazer amor, digo, fazer humor, com pornografia. Fosse matiné ou qualquer outro horário. Sem falar dos famosos ladrões de mulheres.

Não só pelas mulheres, mas as transações comerciais com o povo do circo também eram feitas com muito cuidado. Não eram todos os comerciantes da cidade que confiavam em “gente de circo”.

Ainda bem que o imaginário do circo não guarda só desconfianças, desconforto e mediocridades.

Saudosos

Não é difícil de achar quem sinta saudades de circos visto no passado. Quem lembre e lamente que eles já não apareçam muito por aqui.

A dita pós-modernidade, as novas mídias, a indústria cultural, ou sei lá quem ou o que, deve ter contribuído para a diminuição da freqüência com que os circos aparecem.

Antes, a chegada de um circo numa cidade do interior, como Irará, era motivo de festa e assunto. Comentário geral. Dos meninos nas escolas, guardando os seus cupons de descontos para a matiné, oferecido pelo circo. E dos mais velhos, nas suas conversas de esquina ou de porta de bar.

O circo se tornava então, por algumas semanas, o equipamento cultural mais requisitado. A programação era o entretenimento preferido, quando não, o único.

Aqueles que caiam na graça do público, toda semana anunciavam a sua partida. “É último espetáculo nessa cidade!”. O resultado era certo. Casa cheia e mais outros anúncios do mesmo no fim de semana seguinte. Nessa, teve circo que ficou na cidade por volta de oito ou dez semanas.

Não raro, algum bordão dito por um palhaço virava mania na cidade.

“Maisoía a fuleragem”.

A algazarra era total. Palhaços que interagiam com o público e tiravam alguns do sério. A memória oral do cotidiano urbano iraraense, certamente ainda guarda, casos de discussão e até de briga envolvendo público e pessoas do circo.

Também era possível ver ao vivo, alguns números, que antes do “Mister do M”, impressionavam e intrigavam ao mundo inteiro.

Lembro-me de um dia, quando tinha por volta de cinco ou seis anos, e os circos eram armados mais ou menos onde hoje é deposito do D. Barbosa, voltar para casa pensativo.

“Como era que o mágico conseguia dividir aquela mulher em três pedaços e depois juntar novamente?”.

Claro, que tem lembranças também com circos armados no local atual. Primeiro onde hoje é a Rodoviária, por volta de meados pra final dos anos 1980. E depois já no terreno da Casa da Cultura, após a inauguração do Terminal Rodoviário em 1991, na sua frente.

Teve uma fase que os circos entraram numa de buscar celebridades para atrair público. Primeiro no âmbito baiano. Mara Maravilha, Zé Paulo e Tia Arilma (nossa! quem é “teen” com certeza não vai lembrar dessa última).

E teve circo que trouxe estrela nacional. O ator global Marcos Frota, então um apoiador e divulgador da arte circense, esteve em Irará no espetáculo de um circo. Casa cheia.

Não vi, porque lá não fui, porém, depois me contaram. O ator ajoelhou-se para fazer uma oração e tome-lhe vaia... Público de circo é mesmo imprevisível.

Ah! Lembrei agora de um circo que anunciava um trapezista equilibrando-se no seu (sic) “arame vertical”. O arame na verdade era inclinado.

Malabarismos (sem perdão do trocadilho, já que adoro usá-los) deve ser mesmo o que os circos devem fazem hoje pela sua sobrevivência.

Corda bamba

A situação se apresenta difícil. Ao que percebo por aqui, a arte circense está mesmo na corda bamba.

(Tome-lhe trocadilho! Mais uma vez, desrespeito as etiquetas do jornalismo. Afinal, subverter a ordem, vez em quando é bom).

Os tempos vão mudando e os circos já não atraem tanto ou chamam atenção como outrora.

Hoje, se o circo pegar fogo, talvez o palhaço não esteja nem um pouco animado para dá o sinal. Quem dirás, salvar a bandeira da Pátria amada.

Sinais de heroísmo. No equilíbrio pela sobrevivência, buscando freqüência e apóio dos que ainda admiram essa arte ou de editais e outros projetos de entidades como a Funarte e a Funceb, os circos lutam pela sobrevivência.

Em Irará está mesmo raro a presença de grandes circos no centro da cidade. Vez por outra aparecem aqueles que só se atrevem a armar o seu picadeiro na zona rural ou em regiões periféricas da cidade.

E desta vez foi assim. A percepção de que o circo estava sendo armado. Depois o anúncio.

Lá estava rodando pelas ruas da cidade, um carro modelo Celta, com sua mala aberta e o seu som potente. Estilo bem diferente dos velhos reclames de circos, feitos em carros de som coloridos e pessoas fantasiadas, quase como num desfile festivo.

Depois o anúncio de que aquele domingo já era o último dia do circo na cidade e que eles já estavam de partida. E foram embora mesmo. Estiveram apenas de passagem por Irará.

Será que faltou público? Será que foi algum outro problema?

Não ouvi comentário, nem percebi entusiasmo das pessoas com o circo. Nada. É como se aquilo não tivesse acontecido. O circo chegou e já tinha ido embora.

Só dias depois, fiquei sabendo de um amigo que recebera um convite/cantada: “Vamos ao circo!?”. Taí, não é que apesar dos pesares, ainda existe alguém que ver em um espetáculo circense, um bom programa para se fazer a dois?

Para ouvir: “O circo chegou” de Jorge Ben Jor. - Confira a letra

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